segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Sonhos de Infância

Realizar sonhos de infância é bem mais do que satisfazer desejos, é alimentar todas as nossas vontades e fazer com que elas se tornem reais e duradouras. Cada momento que vivemos destes sonhos, que ficaram na nossa memória, são significativos para o nosso aprimoramento e também para o nosso conhecimento do mundo que antes só imaginávamos e agora descobrimos com mais detalhes e precisão.
Quando finalizamos um processo deste tipo e conhecemos tudo que era possível desbravar, ficamos com uma sensação enorme de felicidade e de dever cumprido, onde nenhuma hipótese de deslise foi esquecida e todos os detalhes nos fizeram reconhecer de vez o que alimentávamos somente em sonho.
Tinha este desejo com a cidade de Salvador, pois sempre passava por lá corrido e nunca tive tempo de conhecê-la melhor, em detalhes. Agora fui com mais tempo e pude perceber que nem tudo são riquezas e que a cidade carrega consigo muitas mazelas das cidades grandes e que as diferenças culturais são bem maiores do que imaginava. Foi bom conhecer cada igreja, cada detalhe da colonização, saber um pouco mais da cultura do Brasil e saber que o município possui altos e baixos, locais velhos e novos. Algumas áreas de Salvador são fantásticas no desenvolvimento imobiliário e comercial, outras áreas padecem e sofrem com a falta de estrutura. O centro histórico tem lados preservados, outros caindo os pedaços e com altas chances de desaparecerem se nada for feito urgentemente. 
Na Baía de Todos os Santos, podemos encontrar favelas e condomínios de luxo, convivendo em harmonia gritante e nem sempre bonita aos olhos. Salvador tem locais sinistros, áreas ruins de andar à pé e com acessos complicados mesmo para quem está de carro ou ônibus. O trânsito está caótico e não funciona em determinados horários do dia. Alguns bairros estão bem organizados, outros totalmente abandonados e cheios de favelas, digo, bairros populares, como os próprios baianos chamam.
Descobri que o Dique do Tororó não tem só orixás, tem beleza e contemplação no meio de uma cidade fervente e cheia de moradias e viadutos intermináveis, cheios de mendigos que pedem com um valor tabelado: R$ 2,00. 
O Shopping Iguatemi cresceu, ficou mais bonito, mas continua um labirinto de emoções, onde não sabemos como entramos e nem tão pouco por onde vamos sair. As lojas são pequenas e distribuídas em ruelas que passam por reformas e em alguns espaços estão escuras e quentes. Não vi muita evolução desde a última vez que o visitei, há 26 anos.
É possível desfrutar bem das praias que fazem o litoral da cidade, mas é preciso ter cuidado em algumas áreas, pois a marginalização e o consumo de drogas é muito grande e termina deixando os locais impróprios. A Praia de Itapuã e a Porto a Barra são as mais frequentadas e as piores para aproveitar o mar. Não entendi ainda como as pessoas migram para estes espaços se eles são os mais desorganizados da cidade e apresentam a maior quantidade de lixo por metro quadrado. 
O policiamento nas ruas aumentou e agora percebemos que os mendigos e meninos de rua estão mais ausentes do Pelourinho, onde faziam a festa e roubavam a todos descaradamente. O que ainda incomoda são os vendedores de colares que usam aquela conversa fiada de presentear o visitante com uma fitinha para tentar vender um produto que não vale a metade do preço que cobram. É irritante perceber como os baianos são indiscretos, indelicados e como gritam e soltam palavrões por tudo, seja no trânsito, numa conversa ou só para fazer média. 
O Aeroporto de Salvador foi o primeiro lugar do tipo que vi pessoas mendigando e circulando nas mesas em busca de comida. Vi também no Shopping Iguatemi alguns vendedores ambulantes tentando vender, nos corredores, celulares piratas para as pessoas que passavam. Percebi que o primeiro andar do Mercado Modelo oferece preços mais baratos e que o acarajé é bem caro, mas muito consumido.
A Feira de São Joaquim foi a minha decepção. Achei que iria encontrar um local agradável e cheio de diversidades, mas só vi desorganização, sujeira, lama e cheiro de podre por todos os locais que andei. Comprar algo ali, só se for para realizar oferendas aos orixás, pois a maior concentração de lojas para este fim está por lá. A feira de frutas e verduras só compensa para quem compra em grande quantidade e a disposição para andar por lá é necessária para qualquer um, já que a maioria dos itens à venda ficam expostos de modo desorganizado e sem possibilidade de fácil acesso.
A Igreja do Bonfim continua a mesma, só que agora com uma praga de fitinhas por todos os lados. Os pais de santo que vendem um "axé" ainda estão por lá, comercializando uma bênção e tornando o ato um pouco caricato e digno de uma cena de humor, pois num dado momento eles se perdem com o ritual e não sabem o que é reza ou o que é brincadeira.
O Elevador Lacerda está em manutenção, de mal a pior, e com filas gigantescas.
Notei que o catolicismo e o candomblé são a mesma coisa para os baianos e que eles ainda não distinguiram Nossa Senhora da Conceição de Yemanjá e Deus de Oxalá, pois o que divide estas diferenças está muito além do entendimento e faz parte da tradição de todos eles. Os despachos são como garrafas "pet" jogadas na rua, pois em toda encruzilhada existe um. Eu me deparei com três.
A "Falsa Baiana" como cantava Gal Costa, realmente existe e está nas ruas do Pelourinho distribuindo simpatia por dinheiro, pois se não for assim, viram a cara e deixam os turistas a ver navios. 
O Pelourinho passa por revitalizações, está mais limpo, sendo possível ver em alguns locais a cor voltando aos casarios e fazendo bonito nas ladeiras por onde uma infinidade de turistas caminham diariamente.
O Rio Vermelho não tem o requinte que o tornou famoso e o que Jorge Amado tanto falava ficou na história, no passado. Hoje ele é bem movimentado nos finais de semana, mas uma escuridão durante a semana. O Largo da Mariquita melhorou muito e se tornou uma boa opção para um petisco rápido e divertimento nos finais de semana, já que alguns projetos culturais acontecem por lá e fazem um barulho danado nas madrugadas. A Casa de Yemanjá é um santuário dos pescadores, onde os encontros de todos eles no início do dia e nos finais de tarde fazem com que o orixá das águas salgadas tenha local certo de devoção.
Notei mesmo assim, com todas estas observações inquietas, que Salvador e a Bahia são riquíssimas, possuem belos locais para serem visitados e que minhas férias valeram cada minuto por aqui. Aproveitei bem, pois vi o que gostei e me dei ao prazer de observar também o que não era do meu agrado, mas que seriam necessários para formalizar dentro de mim o que precisava ter para conceituar bem esta cidade que até então só conhecia superficialmente.
Valeu, Bahia, Salvador, em breve volto...

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